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Na sexta-feira dia 04 de abril, encerramos a primeira turma do Curso de Formação Inicial Continuada em Introdução à Produção Audiovisual do CTCD, com os vitoriosos 14 alunos que, depois de atravessarem uma árdua seleção com 173 inscritos, foram selecionados junto com outros 11 alunos, que, por circunstâncias diversas, não puderam prosseguir conosco.
Agora, 3 meses depois de disciplinas como Roteiro, Produção, Direção, Direção de Arte, Som Direto, Captação e Edição de Imagem e Som, eles concluem seus trabalhos em uma exibição emocionante dos cinco trabalhos concluídos - Ana, Call Center, Cícero, Dona Rosa e Paredarte.
Nossos agradecimentos aos coordenador de conteúdo e professor Márcio Andrade, à coordenadora pedagógica Maria Betânia Oliveira, aos professores Milena Evangelista, Leonardo Castro, Séphora Silva, Pedro Santos, Kleberson Trindade e João Maia pela dedicação e profissionalismo, à gestora do CTCD Selma Leite pela confiança e apoio e, principalmente, aos alunos que se superaram tecnica e artisticamente ao longo do trabalho.
A respeito dos curtas, o coordenador do curso Márcio Andrade escreveu algumas breves palavras sobre o processo criativo e os resultados alcançados em tela pelos alunos. Confira os textos:
Cícero - Sobre tempo(s) e espaço(s)
(Direção - Alberto Saulo, Erica França e Laís Santos)
Nascendo com um ar mais experimental na forma de compor sua narrativa, Cícero une imagens, sons e palavras para fazer o espectador imergir no universo particular de um ser deslocado no tempo e no espaço, que vive à margem, mas não sente necessidade de se encaixar.
Enquanto que os planos longos e solitários revelam a solidão e o deslocamento de seu protagonista em relação à sociedade, a música de Victor Araújo parece amenizar a dor das imagens que o cercam e os textos de autores pernambucanos que acompanham sua jornada tornam ainda mais complexa sua possibilidade de se encaixar no nosso cotidiano normatizado. Enquanto tantos almejam ser “normais” para se encaixar em um sistema que forma pessoas carentes de alma, Cícero deliberadamente se desencaixa deste modelo de vida, procurando experimentar consigo mesmo a espontaneidade, o imprevisto, o marginal.
Em certo momento, vemos Cícero observar um protesto que segue pela Rua da Aurora: enquanto uns protestam por melhores condições de vida para si, nem percebem o sujeito encostado ao Capibaribe que os observa anônimo. Nem mesmo as nossas tentativas de trabalhar coletivamente revelam nosso olhar para o Outro: andamos de mãos dadas por um mundo melhor para quem é igual a nós, tem os mesmos desejos e não com quem é deslocado. Cícero é aquele que, em frente à igreja, vê o tempo se dilatar, observando a divisão entre céu e terra que, em um único plano, parecem dividir o mesmo espaço sem compartimentos ou estantes.
Este é Cícero: céu e terra, sagrado e profano, epifânico e prosaico. Cícero é todos e nenhum ao mesmo tempo.
Call Center - Entre o deboche e a denúncia
(Direção - Emerson Pereira e Roterdan Lopes)
Realizar documentário demanda de seus autores coragem e ousadia para empregar narrativas alheias para desenvolver uma impressão particular sobre o mundo. No caso deste curta-metragem, seu interesse parte justamente da própria experiência dos realizadores com o mercado de call center, espaço do primeiro emprego de vários e vários universitários.
Com um olhar claramente debochado e corajoso em quebrar sigilos de confidencialidade entre funcionário e empregador, os autores carregam o embrião do famoso documentarista Michael Moore ao deixar a objetividade de lado para expor todas as dificuldades de um atendente de call center, enfrentando opressores e poderosos com a irreverência de cineastas como Marcelo Pedroso e Sérgio Bianchi.
Destaco ainda a ausência de trilha sonora incidental, que oferece espaço para o interessante uso dos efeitos sonoros de ambiência do espaço de trabalho do call center, traduzindo, sem quaisquer palavras, uma sensação de certa claustrofobia cotidiana. Vocês oferecem voz aos sujeitos que trabalham nestes espaços e, de algum modo, se sentem cercados em seus micro-cubículos por um emaranhado de vozes e comportamentos que os oprimem e os obrigam a seguir protocolos e regras que, no final de um cansativo dia, pouco sentido fazem fora do ambiente corporativo.
(Direção - Alberto Saulo, Erica França e Laís Santos)
Nascendo com um ar mais experimental na forma de compor sua narrativa, Cícero une imagens, sons e palavras para fazer o espectador imergir no universo particular de um ser deslocado no tempo e no espaço, que vive à margem, mas não sente necessidade de se encaixar.
Enquanto que os planos longos e solitários revelam a solidão e o deslocamento de seu protagonista em relação à sociedade, a música de Victor Araújo parece amenizar a dor das imagens que o cercam e os textos de autores pernambucanos que acompanham sua jornada tornam ainda mais complexa sua possibilidade de se encaixar no nosso cotidiano normatizado. Enquanto tantos almejam ser “normais” para se encaixar em um sistema que forma pessoas carentes de alma, Cícero deliberadamente se desencaixa deste modelo de vida, procurando experimentar consigo mesmo a espontaneidade, o imprevisto, o marginal.
Em certo momento, vemos Cícero observar um protesto que segue pela Rua da Aurora: enquanto uns protestam por melhores condições de vida para si, nem percebem o sujeito encostado ao Capibaribe que os observa anônimo. Nem mesmo as nossas tentativas de trabalhar coletivamente revelam nosso olhar para o Outro: andamos de mãos dadas por um mundo melhor para quem é igual a nós, tem os mesmos desejos e não com quem é deslocado. Cícero é aquele que, em frente à igreja, vê o tempo se dilatar, observando a divisão entre céu e terra que, em um único plano, parecem dividir o mesmo espaço sem compartimentos ou estantes.
Este é Cícero: céu e terra, sagrado e profano, epifânico e prosaico. Cícero é todos e nenhum ao mesmo tempo.
Call Center - Entre o deboche e a denúncia
(Direção - Emerson Pereira e Roterdan Lopes)
Realizar documentário demanda de seus autores coragem e ousadia para empregar narrativas alheias para desenvolver uma impressão particular sobre o mundo. No caso deste curta-metragem, seu interesse parte justamente da própria experiência dos realizadores com o mercado de call center, espaço do primeiro emprego de vários e vários universitários.
Com um olhar claramente debochado e corajoso em quebrar sigilos de confidencialidade entre funcionário e empregador, os autores carregam o embrião do famoso documentarista Michael Moore ao deixar a objetividade de lado para expor todas as dificuldades de um atendente de call center, enfrentando opressores e poderosos com a irreverência de cineastas como Marcelo Pedroso e Sérgio Bianchi.
Destaco ainda a ausência de trilha sonora incidental, que oferece espaço para o interessante uso dos efeitos sonoros de ambiência do espaço de trabalho do call center, traduzindo, sem quaisquer palavras, uma sensação de certa claustrofobia cotidiana. Vocês oferecem voz aos sujeitos que trabalham nestes espaços e, de algum modo, se sentem cercados em seus micro-cubículos por um emaranhado de vozes e comportamentos que os oprimem e os obrigam a seguir protocolos e regras que, no final de um cansativo dia, pouco sentido fazem fora do ambiente corporativo.
Paredarte - De caos e de cor
(Direção - Júlio Braz e Marília Morais)
Um estudo sobre um processo criativo marginal, o curta revela o uso da cor e da forma como forma de protesto e de instalar um caos programado e articulado. O uso de uma fotografia com intenso colorido revela ao espectador camadas de afeição pela própria cor e suas possibilidades de provocar emoções.
O roteiro desenvolvido equilibra depoimentos de artistas com imagens de seu trabalho através de enquadramentos amplos e espaços claros, trazendo para o espectador que desconhece este tipo de trabalho um ar familiar e menos ameaçador do que é conhecido através de outras representações.
Ana - Sobre o moto perpétuo da trans-form-ação
(De Cristiano Viana, Douglas Duan, Elizabeth Nascimento, Hávila Ellen, Luiz Eugenio e Priscilla Melo)
Carregando certa esquizofrenia entre a banalidade do cotidiano e a estranheza das nuances da mente, Ana nasce como um processo em constante transformação, podendo ser sintetizado tematicamente sobre como estar vivo naturalmente demanda de nós decisões que tomamos e refazemos diante da insatisfação.
Evidenciando referências claras ao gênero noir – através da construção de personagens distorcidos e pouco confiáveis, como o homem deslocado do mundo sendo dominado por uma femme fatale -, o curta revela muito sobre seu próprio processo criativo: personagens que se transformam, equipes que se transmutam e uma narrativa que, até nos momentos da edição, atravessa alterações significativas. Quando mergulha abruptamente em um universo narrativo desconhecido através de uma narração em off com caráter expressionista, o espectador embarca sem dificuldade na trama carregada de estranheza e se permite cativar pelos protagonistas de motivações misteriosas.
Ao final de tudo, Ana e as ações tomadas pelo grupo desvelam um vácuo que exibe um processo de transformação que sucede entre limites – entre o desejo e a obsessão, entre o são e o doentio, entre o processo e o resultado, entre o articulado e o improvisado. Não existem heróis ou sobreviventes: seu constante jogo entre vilanias e vitimizações se emaranha de tal forma que se mostra complicado para o espectador identificar-se com qualquer dos protagonistas.
Dona Rosa - Dos espaços de encontro
(Direção - Jocilene Silva, Maria do Carmo Guerra e Rebeca Cavalcanti)
As relações entre sujeito e mundo se modificaram bastante desde que o mundo é mundo. Se, na Pré-História, esta conexão acontecia de forma mais direta, com as pessoas olhando para o sol para saber as horas e obtendo mantimentos diretamente do plantio e da caça, em nossa contemporânea Sociedade da Informação, esta ligação se encontra cada vez mais mediada.
Hoje, não basta somente visitar um lugar ou conhecer novas pessoas, mas registrá-las por celular, smartphones, tablets e outras tantas tecnologias que se tornaram extensões dos nossos corpos. Dona Rosa, a personagem, vive em um mundo que não reconhecemos mais: suas histórias e memórias cobrem as lacunas de uma imagem que, como espectadores do mundo, nos falta. E Dona Rosa, o documentário, nos oferece um pouco destas imagens, registrando, ainda que a partir da narrativa de sua protagonista, a história de um espaço a partir do seu olhar em uma relação pessoal, sem mediadores tecnológicos, que guarda memórias em seu corpo e sua alma.
As imagens que revelam o poder “salvacionista” da arte e da cultura encantam por revelar a nós, espectadores, nosso afeto pela possibilidade da criação nos conduzir além de nós mesmos. Dona Rosa sente liberdade em seu corpo, sente liberdade para vivenciar aquilo que deseja e lhe satisfaz. Ao se fantasiar e se apresentar diante da câmera ou quando começa a dançar com roupas cotidianas pelo espaço verde em ruínas, Dona Rosa manifesta para nós, espectadores, uma relação concreta entre uma alma e um espaço mediado pela arte, tornando o Nascedouro um lugar ainda mais familiar para si.
Parabéns a todos e muita arte nessa vida!